segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Entrevista na revista Muito.

Entrevista com Victor Mascarenhas, feita por Tatiana Mendonça e publicada na edição do dia 7/12, da Revista Muito, do jornal A TARDE, com o título “O dark side soteropolitano”.

Você se sente melhor no cinema, na literatura ou na publicidade, incluindo aí as campanhas políticas?
Na literatura, sem dúvida. Escrever dá uma liberdade e uma satisfação que são absolutamente minhas. Na literatura escrevo por prazer, na publicidade, por obrigação.

O que é mais difícil na hora de escrever?
Começar a escrever. Depois saber se o que você escreveu é bom, se deve ser reescrito ou descartado.

Por que você decidiu ambientar os contos de "Cafeína" em Salvador?
Porque é a cidade em que moro e trabalho. Sinto falta de uma literatura que fale da cidade de verdade e não só de percussionistas, cantores, gente feliz, malemolente e todos esses clichês. Meu livro fala de pessoas que a gente vê por aí.

Qual seu interesse pelo dark side, a ponto de criar essa "Disneylândia dos desgraçados", como disse Fausto Fawcett no texto de apresentação do livro? Essas vidas tendem a ser mais interessantes?
De perto, toda vida é cheia de dramas, tragédias e histórias. Mas essas histórias quase nunca estão visíveis. É preciso olhar pelo outro lado, pelo oculto, pelo não-dito, mas sempre mantendo o bom humor e a capacidade de rir da nossa própria miséria.

Você criou dois roteiros e uma peça de teatro adaptados de alguns contos, livres para quem quiser produzir, com o objetivo de "ampliar o alcance da obra". A literatura não se basta? As adaptações de livros para a televisão ou o cinema costumam te agradar?
O alcance de um livro é muito limitado, sobretudo quando publicado por uma editora sem distribuição nacional. Levar o livro para outros meios apresenta a obra para outros públicos e para novos leitores em potencial. É claro que existem boas e más adaptações, mas quero correr todos os riscos.

Que personagem mais te fascinou?
Raskólnikov, de Crime e Castigo. Tanto pela minha identificação pessoal, quanto pela admiração absoluta pelo livro.

O que você está lendo neste momento?
Fantasma sai de cena, de Philip Roth.


Além de publicar a entrevista, a Muito disponibilizou um dos contos de Cafeína no seu site. Para ler, clique aqui.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Cafeína na Fliporto.

A Fliporto – Festa Literária Internacional de Porto de Galinhas – é um dos principais eventos da literatura do país e acontece de 6 a 9 de novembro em Porto de Galinhas (PE). Esse ano, o evento vai contar com a presença de grandes nomes nacionais e internacionais, como José Eduardo Agualusa, Thiago de Mello, Ariana Suassuna, Lobo Antunes, Affonso Romano de Sant'Anna, Alberto da Costa e Silva, Ana Paula Tavares, Marcelino dos Santos, Paulina Chiziane, Quincy Troupe, Wangari Maathai, Pepetela, José Miguel Wisnik Maria Adelaide Amaral e muitos outros.
Em meio a tantos nomes e tantos eventos, estarei lançando Cafeína por lá, no dia 8 de novembro, a partir das 16h, no estande da livraria Jaqueira na Feira de Livros. Com esse lançamento, espero conquistar novos leitores, abrir novas portas para que o livro possa continuar sua carreira e chegar a cada vez mais pessoas.


Para maiores informações sobre a Fliporto, clique aqui.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Construindo o livro.

Depois de ganhar o prêmio, chegava a hora de fazer o livro sair do Word e ir para o papel e do papel para as estantes. Precisava de uma capa e, como estreante pretensioso que sou, precisava de um cartão de visitas que apresentasse a mim e ao meu trabalho para os incautos que cruzassem o caminho de Cafeína.
Por sorte, as duas pessoas que sempre pensei para isso aceitaram o meu convite e ajudaram a fazer o livro do jeito que imaginei. Para a capa, convidei um amigo querido e um dos mais brilhantes ilustradores do país, Cau Gomez.
Cau não só aceitou o convite como ainda encarou uma feijoada num sabadão quente de Salvador para discutir o conceito e as idéias que ele tinha sobre o trabalho. Dias depois recebo uma ilustração genial, que vem acompanhada por uma deliciosa revelação: essa mesma ilustração, com algumas alterações, foi feita originalmente para Angeli e está na parede da casa dele. Logo de Angeli, um dos caras que mais admiro nos quadrinhos e de quem sou fã incondicional desde os a nos 80, quando ele lançou a revista Chiclete com Banana, que colecionei do primeiro ao último exemplar.
Para fazer o texto de apresentação, meu escolhido era um cara mais conhecido pelas suas músicas, mas que escreveu um livro fundamental na minha formação e na concepção de Cafeína. O livro chama-se Básico Instinto e o autor é Fausto Fawcett.
Fausto foi de uma generosidade inacreditável. Consegui o telefone dele com uma pessoa que conhecia outra pessoa que conhecia um amigo dele e liguei, morrendo de vergonha, para o Mefisófeles de Copacabana. O cara atendeu, foi super gente boa e disse pra eu mandar o livro pra ele dar uma olhada. Mandei e dias depois ele me liga, dizendo que tinha gostado, entendido o porquê do meu convite e dizendo que ia fazer o texto.
Tempos depois e alguns telefonemas trocados, chega o texto, que, além da generosidade de Fausto, mostra uma incrível compreensão do conceito do livro e ainda me mostra caminhos e interpretações que enriqueceram ainda mais a minha modesta coleção de contos. Fausto me deixou, como ele mesmo diz numa das suas músicas, com o “ego dissolvido” e ganhou a minha gratidão eterna, que só não é maior do que a minha admiração pelo seu trabalho.
Com esses dois caras no projeto, minha responsabilidade com o leitor aumenta, mas também aumentam as chances das pessoas gostarem mais do livro. Apesar dos meus contos...

Release do livro.

“Cafeína” é o livro de estréia de Victor Mascarenhas, um dos vencedores do Prêmio Braskem de Literatura 2007. O livro - que tem a capa ilustrada por Cau Gomez e texto de apresentação de Fausto Fawcett - é uma coleção de doze contos em que não há heróis ou mocinhas, muito menos espaço para mitificações. Os personagens são motoristas de táxi, porteiros, garçons, aposentados, prostitutas e gente comum em geral.
“Os doze contos de ‘Cafeína’ são um passeio dantesco por vidinhas que andam em círculos de imobilidade mental, social, sentimental. Pessoas cujos corações transformaram-se em bombas-relógio prontas a explodir por qualquer motivo”, é o que diz Fausto Fawcett no seu texto de apresentação, “Victor sabe muito bem flagrar o dark side, o lado escuro cheio de vida estranha dos habitantes de Salvador, sabe muito bem tocar na vibração da cidade como metrópole de um país ainda periférico, metrópole que é aglomerado urbano cheio de tensão e iminência bárbara. Victor sabe muito bem derramar sal na ferida das vidas vazias”, diz Fawcett.
Segundo Victor Mascarenhas, o título “Cafeína” - que é também o nome de um dos contos - é muito mais um conceito de todo o projeto, que também está na internet, onde estão disponíveis dois roteiros para cinema e uma peça de teatro, adaptadas de contos do livro. “A idéia é que o livro não se encerre somente nele mesmo. Quero que ele ganhe outras mídias, que alguém filme esses ou outros roteiros baseados nele, que monte uma peça com esse ou outros textos adaptados das minhas histórias. O importante é que o trabalho esteja vivo e chegue ao maior número de pessoas possível”.
No blog do livro (livrocafeina.blogspot.com), estão disponíveis, além dos roteiros e da peça, textos dos escritores Adelice Souza e Fausto Fawcett sobre a obra e informações sobre o autor, o livro, contato e espaço para deixar o seu comentário.

O sal na ferida.

Texto de Fausto Fawcett. Escritor e músico.


Victor Mascarenhas sabe derramar sal na ferida das vidas vazias. Derrama bem devagar só pra curtir o cidadão ou, melhor dizendo, o sub-cidadão estribuchando ridiculamente por causa do seu ferimento de abandono social, de náufrago existencial. Os doze contos de “Cafeína” são um passeio dantesco por vidinhas que andam em círculos de imobilidade mental, social, sentimental. Pessoas cujos corações transformaram-se em bombas-relógio prontas a explodir por qualquer motivo. Implodir ao menor sinal de emoção forte que os tire da rotina de carregar a pedra de Sísifudeu que eles carregam em círculos de mediocridade e paralisia mental, social. Infartos de tudo e de todos. Isso fica patente na maioria das histórias e Victor se comporta como um fiscal de afetos doentios, um fiscal de vidas reduzidas a taras insólitas. Ele, enquanto fiscal de afetos doentios, vai nos guiando por uma espécie de Disneylândia dos desgraçados, gente que nalgum momento de suas vidas desperdiçadas resolve dar um último grito de afirmação vital, se agarrando a alguma coisa, alguma pessoa, alguma atitude mandando ver num desesperado sim ou num fulminante e espetacular não à existência. Taras insólitas. É a isso que se reduzem as vidinhas que andam em círculos de mediocridade, imobilidade, espécie de coma mental, social.
Victor Mascarenhas como bom capataz de sonâmbulos e zumbis existenciais camuflados no dia-a-dia, nos convida a segui-lo com sua escrita-facão, numa batida pelos becos sem saída das mentes encurraladas num ponto fixo e maníaco das suas vidas desesperadas. É o que fica explícito na maioria das fábulas cheias de situações inusitadas que pisam fundo no acelerador do grotesco, do patético e do sórdido monitorados pelo Grande Exu do Sarcasmo.
É nervosa a matéria-prima com que trabalha Victor Mascarenhas, o capataz dos sapiens-zumbis, dos sapiens-sonâmbulos, dos sub-sapiens. Com sua escrita-facão ele dá uma blitz rasante em Salvador e pega no flagrante todo o sórdido-patético-grotesco das vidas reduzidas a taras surpreendentes. Mas por incrível que pareça, existe uma verdade-constatação que serve de sinistro álibi para essa rapaziada bicho-solto do convívio social. A verdade-constatação de que existem fomes de viver que são impossíveis de serem saciadas com democracias, confortos tecnológicos, consciência social, mundo melhor, submundo crítico etc. Mesmo sendo rico ou classe média. Mesmo sendo pobre ou fodido super-lumpem pra caralho as promessas de felicidade e contra-felicidade que estão por aí podem não interessar.
Aí, meu chapa, a pessoa pode virar buraco negro de onde não sai mais luz e pra ela só resta a gravidade de uma atitude violenta quase sempre gratuita. Sem escala em frustrações ou antecedentes de trauma psicológico. Não tem por quê. É ódio à toa.
Victor Mascarenhas trabalha direto o barato de emergência fulminante espalhado nos atos e posturas desses personagens maníacos, tarados, desgraçados afirmativos, solitários fundamentalistas do inesperado, gente catástrofe gerando mitologia do desengano na confusão urbana.
Victor sabe muito bem flagrar o dark side, o lado escuro cheio de vida estranha dos habitantes de Salvador, sabe muito bem tocar na vibração da cidade como metrópole de um país ainda periférico, metrópole que é aglomerado urbano cheio de tensão e iminência bárbara. Victor sabe muito bem derramar sal na ferida das vidas vazias, Victor Mascarenhas sabe das coisas. Fiquem de olho nele.



* O texto está editado. A versão integral está disponível apenas no livro.